Em meio a tanto progresso e avanço tecnológico que vivemos hoje, é interessante constatar como as relações afetivas continuam conservadoras e obsoletas. Vivemos constantemente na premissa do amor romântico onde o outro tem que nos servir constantemente, insto é, o outro se torna um objeto que tem de me fazer feliz e fazer com que me sinta completo e desejado.
Em meio a tanto discurso de progresso, hoje o que se busca não é uma relação onde existe individualidade, respeito, felicidade e o prazer de estar junto. Prevalece ainda a relação de dependência em que um responsabiliza o outro pela sua felicidade ou tragédia. O amor romântico nos mantém presos e divididos.
Ficar sozinho se torna algo a ficar doente, sinônimo de infelicidade e derrota. Este processo de divisão onde só posso ser feliz encontrando minha metade historicamente tem levado um dos dois ao cárcere da submissão. Alguém abandona seus projetos para se amalgamar ao projeto do outro. Essa é a intimação do amor romântico: o outro tem que saber o que não sei e vice-versa. Uma idéia funcional, prática e trágica.
A idéia de hoje deveria ser parceria. Deveríamos trocar o amor de necessidade, pelo amor pelo amor de desejo, isto é, eu gosto e desejo a companhia do outro, mas não necessito, o que é bem diferente. É interessante constatar que com o avanço tecnológico, que exige mais tempo individual, paradoxalmente as pessoas morrem de medo de ficar sozinhas e não aprendem a conviver bem com elas mesmas.
A globalização que deveria nos aproximar mais, pelo contrário, deixam-nos reféns de relações que continuam a ser de dominação e concessões exageradas. A idéia de alma gêmea nada mais é do que a invenção do outro ao nosso gosto e prazer.
Não deveríamos mais nos sentir metades nem fragmentados. Somos inteiros. O outro que se estabelece o elo não é o príncipe ou salvador de coisa nenhuma. É apenas mais um companheiro de viagem. Estamos na era da individualidade, porém nos tornamos egoístas. A individualidade não tem nada a ver com o egoísmo, pois o egoísta sempre se "alimenta" da energia do outro seja ela financeira ou moral.
Em tempos modernos, o amor deveria ter mais sentido, feição e significado. Deveria unir pessoas inteiras e não juntar metades. Esta nova relação só será possível para aqueles que conseguirem trabalhar sua individualidade. Quanto mais o sujeito conseguir trabalhar sua individualidade mais estará preparado para um encontro fundamental.
Às vezes a solidão é boa, ficar sozinho não é algo que temos de nos envergonharmos, ao contrario, ela dá dignidade a pessoa e boas relações são bem parecidas com ficar sozinho. O paradoxo da alteridade é esse: estamos unidos, porém separados. Ninguém exige nada de ninguém e ambos crescem.
Deveríamos ficar sozinhos de vez em quando para construir um diálogo interno e descobrir nossa força pessoal. Na solidão, ainda que indesejável companheira, o indivíduo compreende que repouso e a paz só podem ser encontrados dentro dele mesmo e não a partir do outro.
Ao perceber isto, nos tornamos mais tolerantes e compreensivos em relação as diferenças respeitando a maneira e o limite de cada um. Na comtemporaneidade o amor de duas pessoas inteiras seria bem mais interessante e saudável, pois neste tipo de ligação há o aconchego, o prazer da companhia e o respeito pelo ser amado.
(adaptado do texto de Samuel Franco (psicólogo))
Wanderley Elian